18 de fevereiro de 2013

Atenção Extra


Pautada por uma estrutura familiar onde ambos - pai e mãe - trabalham, muitas vezes em período integral, a nova relação pais & filhos, precisa ser repensada e atualizada


Tic tac, tic tac... Não há som mais amedrontador para os pais na atualidade do que o do relógio trabalhando. Passam os minutos, as horas, os dias de uma maneira - aparentemente-, cada vez mais acelerada. E para quem tem filhos essa sensação pode ser dolorosa, pois representa não conseguir aproveitar, como se deveria, o seu crescimento.

Na sociedade atual, muitas vezes, pai e mãe precisam trabalhar fora para garantir Educação e Saúde de qualidade para os filhos. O que deveria ser um direito do cidadão se tornou uma obrigação e, nesse novo modelo, quem perde mais, filhos ou pais? Difícil mensurar...

O que se pode fazer diante dessa realidade, na opinião de especialistas, é procurar viver momentos em família com mais qualidade, cheios de afeto, brincadeiras, compreensão e diálogo. O problema para se chegar a isso, no entanto, está na noção, muitas vezes equivocada, que os pais tem sobre como dar atenção aos filhos. (a matéria continua)



Assista também o vídeo da entrevista com a terapeuta infanil Denise Dias:


 

“Quando um casal decide ter um filho precisa ter em mente que educar não é só levar a criança ao médico, à escola, ao inglês, à academia, etc. Essas são tarefas básicas de cuidadores. As mães hoje se tornaram “mãetoristas” e os pais “paigadores de conta”, só levam, levam e levam, pagam, pagam e pagam, mas não se conscientizam da importância de sentar no chão e brincar daquilo que a criança quer ou mesmo de sentar no sofá para assistir o desenho animado que ela gosta ou jogar o videogame preferido dela. Infelizmente, os pais estão perdendo esse contato na infância com os filhos”, alerta a terapeuta infantil Denise Dias.

O resultado dessa “desatenção”, tem reflexos na vida escolar e na formação da criança, que pode se tornar apática e introvertida e ter problemas de aprendizagem. Hoje em dia, como está cada vez mais comum os pais deixarem os filhos na escola em período integral, é importante lembrar que, tirando o tempo que a criança dorme, resta muito pouco para ela desfrutar com a família, então, se não dá para se ter quantidade, também não se pode abrir mão da qualidade. 

“O tempo destinado aos filhos deve ser dos filhos e não de compromissos sociais e profissionais nos quais eles, os filhos, são apenas acessórios, como por exemplo a festa de aniversário do filho do diretor de RH onde as crianças são divertidas por um animador profissional enquanto os pais passam a agenda da semana em dia, ou da caminhada pelo parque onde é possível encontrar aquele cliente e causar uma boa impressão ou mesmo nas compras no shopping ou supermercado, onde os filhos só estão juntos porque não se têm com quem deixar ou coisa parecida”, destaca o professor de História, Arnaldo M. de Bacco Junior. 

Neste cenário em construção, de um novo modelo familiar, urge a reflexão dos pais com relação ao seu papel no desenvolvimento dos filhos. “Está faltando afetividade mesmo, no sentido de dar carinho para que a criança se sinta mais especial. Ela precisa do toque, de cafuné, de grudar no corpo da mãe, fazer carinho, se jogar na cama, fazer cabaninha no quarto ou na sala. Se os pais não dão o toque cria-se uma lacuna corporal e, para a criança, isso tem a ver com afetividade. A criança precisa ouvir “vem cá filhinho da mamãe” ou “vem cá bonequinha do papai”, esses mimos não são para infantilizar, mas para que ela se sinta querida. E não há substituto para isso, quem tem que dar esse afeto são a mãe e o pai. Cabe a eles nesse mundo moderno e capitalista, pensar na qualidade do tempo com os filhos, entendendo que educar não é só pagar a melhor escola, dar banho de shopping e levar na melhor pizzaria”, enfatiza Denise Dias.

A diferença nas relações dos pais que compreendem e dão essa atenção extra aos filhos, pode ser sentida na qualidade de vida do núcleo familiar. Há muitos casos em que a mãe pode abrir mão de trabalhar  em meio período ou integral para cuidar dos filhos, mas mesmo as famílias em que os dois trabalham podem encontrar alternativas para  driblar o pouco tempo com os filhos.

O casal Pablo F. Feitosa e Bruna S. F. Feitosa tem três filhos, Samuel de sete anos, João Pedro de cinco anos e Mariana de dois anos. O trabalho do pai exige que ele passe muito tempo fora, em viagens, e para contrabalancear essa ausência, Bruna optou por cuidar dos filhos em tempo integral.

“Não adianta querer tapar o Sol com a peneira, fica uma sensação de culpa por não conseguir conciliar o trabalho com a família, ainda mais para mim que acredito nessa instituição e acho que está se deixando muito de lado a relação pais e filhos. Por isso, aproveito ao máximo o pouco tempo que tenho com eles e, nesses momentos, fica difícil saber quem é a criança, eles ou eu. Levo ao parque para passear, jogo bola, levo ao cinema, ajudo sempre que possível nos trabalhos da escola e também vamos juntos à igreja no final de semana. Percebo que faço falta, depois de alguns dias longe até levá-los na escola os deixa felizes. Às vezes eles querem almoçar comigo e não posso por causa de uma reunião, por exemplo. Fica uma sensação de pesar e se não fosse o apoio da Bruna não sei como administraria tudo isso”, conta Pablo.

Outro ponto delicado da relação de pais e filhos, na atualidade, está no estabelecimento de limites. Como explica a terapeuta Denise Dias, da mesma forma que os pais encontram dificuldade para compreender a importância e dar a atenção extra aos seus filhos, também não conseguem impor limites quando eles aprontam. “Como ficam pouco tempo com a criança, os pais se sentem “monstros” em dar a correção necessária que o filho precisa e, então, há uma inversão de valores. Sempre digo que ‘os filhos se colocam no lugar de filhos quando os pais se colocam no lugar dos pais’.  Se os pais não se colocam no topo da escada da hierarquia, os filhos vão crescendo cada vez mais petulantes e arrogantes. Compensando a ausência dessa maneira, os pais estão  na verdade criando filhos inseguros, porque a criança precisa de uma palavra final certeira”, aponta.

Na casa de Cléber José Moraes e Elvina Lisboa M. Moraes, os filhos Ana Cláudia, de 10 anos e Pablo, de 9 anos respeitam as ordens. “Pai posso assistir o jogo do Corinthians hoje”, pede Pablo. “Não sei, pergunta para a sua mãe, amanhã você sabe que tem aula cedo”, responde o pai.

Assim, dividindo as responsabilidades e não se contradizendo diante das crianças, o casal encontrou a melhor forma de educar os filhos. “Foi algo que aprendemos com o tempo. Às vezes a gente discordava, mas hoje não discutimos mais na frente deles e se um fala o outro acata”, diz Elvina.

A advogada parou de trabalhar com o nascimento dos filhos, mas à medida em que eles foram crescendo sentiu a necessidade de voltar e hoje trabalha meio período. O pai, engenheiro agrônomo, viaja bastante, mas se mantém presente na vida dos filhos e não ‘passa a mão na cabeça’  deles em função da ausência.“É a qualidade do momento que vivemos com eles que determina quem somos e quem eles serão, por isso, aproveito para brincar, colocar para dormir, viajar com eles e ajudar na grande tarefa dessa faixa etária em que estão agora: fazê-los cumprir a rotina, que vivem querendo burlar”, conta Cléber.

Como explica Denise Dias, não há uma fórmula ou um padrão de comportamento para se educar os filhos, mas com um pouquinho de criatividade é possível ‘temperar’ essa relação, mesmo na correria e stress do dia a dia.

“Não é possível que um pai e uma mãe hoje não consigam pensar em uma brincadeira para fazer com o filho, basta parar para pensar o que gostava de fazer quando era criança. As lojas de brinquedos tem uma diversidade tão grande, os canais de televisão oferecem tantas atrações para as crianças... Por exemplo, já que comer é algo que todos tem que fazer, por que não fazer isso juntos e aproveitar para conversar com o filho?  Por que não sentar para assistir TV todo mundo junto, nem que seja por 20 minutos? Por que não deitar junto do filho na hora de ir dormir, fazer um carinho, ler uma historinha? Tudo isso aproxima e cria intimidade entre pais e filhos. Isso é dar  um pouco de atenção extra, é ‘temperar’ um pouco da correria das relações hoje em dia”, conclui a terapeuta.

10 coisas para fazer junto com os filhos
Brincar de bicicleta
Brincar de bola
Brincar de casinha
Brincar de video-game
Brincar de jogos infantis
Brincar de pintura
Contar histórias
Ir ao circo
Ir ao teatro
Ir ao cinema 
Matéria publicada na Edição Especial Revide Educação - 2011

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